I - Desgaste - Outubro de 2010
A comunicação está em
todos os momentos das nossas vidas, aliás, desde a nossa existência no útero
materno já fazíamos uso de uma comunicação própria e desenvolvida por instinto.
Nós somos responsáveis pela nossa forma de comunicar, a mesma em que demonstramos
através das apresentações pessoais, sejam elas de expressão facial, de estilo
ou através do nosso repertório, enfim, temos uma estratégia de comunicação
própria.
Não sei o porquê de eu
escrever isso... Talvez seja a saudade que bate... Talvez isto seja um jeito de desabafar tudo
que está engasgado. Desde que meu pai se foi, tudo mudou.
Meu nome é Petter, tenho 28
anos. Sou
alto, tenho cabelo castanho-escuro e olhos bem pretos.
Meu pai, Gustavo, sempre dizia: Você possui a chave do seu destino, use-a,
organize seu coração do jeito que quer, tranque e suma com a chave, pois você
terá vontade de mudar algo.
Quanta coisa queria mudar.
Estou com meu carro estacionado em frente ao prédio onde meu pai construiu um
império. Uma grandiosa agência de publicidade que por testamento me garante a
maioria das ações da agência. Meu irmão, Alexandre, mudara muito. Ele era meu
melhor amigo, mas só foi um testamento aparecer na nossa frente que não nos
suportávamos mais. Nós dois discutíamos sempre que nos víamos. Alexandre, o
jornalista, era o que mais tinha raiva de mim por ter ficado com a fatia maior
da agência e queria ficar com a mansão que meu pai deixara e onde era o lugar
em que eu vivia. Ele possuía a sua própria família, carreira consolidada, mas
não parecia ser o suficiente.
A agência se chamava Rúbati Comunicações, sobrenome da
família. Ocupava três andares de um prédio bem no centro da cidade e era famosa
por seus trabalhos. Lembro-me de quando tudo começou. Eu era pequeno, mas as
imagens são claras. No princípio era uma pequena sala que ele havia alugado
naquele prédio. Até hoje a sala está lá. Tornou-se o escritório do meu pai.
Está chovendo lá fora, estou
entediado e não quero subir. Queria ficar dormindo, meus pés doem.
Chefiar uma empresa como
essa não é nada fácil. Eu estava recebendo muita pressão psicológica. É muita
responsabilidade.
Não, não é só assinar papéis
e sorrir. Eu era também o Diretor de criação, responsável por praticamente tudo
que era publicado. Antes eu nem imaginava que ia acontecer isso comigo, eu era
apenas um publicitário que havia trocado tudo para ser escritor.
Continua chovendo, ouço
apenas telefones tocando pessoas andando de um lado para o outro. Deitei no
sofá do escritório que agora me pertencia.
- Sr, Rúbati? Desculpe incomodá-lo,
mas a Srta. Madison está insistindo...
A porta se escancarou e
outra mulher interrompeu a primeira.
- Petter. Não quero saber se
você está em mais um momento reflexivo ou não, mas preciso que você ouça meus
argumentos! Não é só vir e me dizer que está ruim!
Levantei do sofá como um zoombie com fome de matar alguém.
Katherine Madison a redatora que eu mais tinha desafeto dentro da empresa. Era
algo estranho, em toda conversa que tínhamos havia uma discussão. Ela era uma
mulher linda, isso não nego. Olhos verdes que lembravam girassóis; cabelos
castanho com seu coque geometricamente perfeito; tinha a mesma idade que eu;
era rígida; impetuosa; sarcástica; e completamente difícil de lidar.
- Fale o que quiser, mas não
se esqueça que fui redator por vários anos igual a você e pra mim aquele slogan
não faz sentido! – disse religando os fusíveis do meu cérebro.
Ela começou a movimentar os
lábios tentando justificar sua idéia, mas não adiantava, quando digo não é não.
- Eu quero que vocês sejam
mais criativos que isto. A agência está perdendo a essência que tinha. Vocês
estão acomodados com a situação por sermos a mais antiga no mercado. Mas se não
nos atentarmos ao novo, logo outra grande agência nos engolirá.
No fim ela bateu a porta
indignada e sumiu. Silêncio novamente. A chuva parou e lá se foi mais um dia.
Meu apartamento era do outro lado da cidade, mas desde que comecei a trabalhar,
tenho passado minhas noites aqui mesmo. Sou solteiro e solitário. Muitas
pessoas me criticam esse meu estado civil, porém eu só fico realmente feliz
estando completamente só. Acho que amava mais escrever do que amar outra
pessoa.
Saí pelos corredores da
agência que estava completamente escura e vazia. Tomei um copo d’água na copa e
voltei. De repente ouvi um barulho vindo do final do corredor. Folhas sendo
amassadas... Caminhei pé ante pé (eu parecia ser uma criança numa aventura).
Segui um ponto de luz no fim do corredor.
- Katherine Madison? O que
você está fazendo há essa hora aqui?
Ela pulou da cadeira.
Levei um susto ao ver Katherine Madison no meio da noite dentro da
agência. Mas não a recriminei, pois fazia o mesmo.
- Desculpe
Petter, não sabia que você estaria ainda aqui... Estou usando meu tempo livre
pra conseguir satisfazer a vossa vontade.
– disse ironicamente.
- Eu não mandei
você fazer hora extra. Mandei você fazer um trabalho descente. – Muitos diziam
que eu era rígido demais com as pessoas, mas apenas estava tentando manter a
empresa de pé.
Ela me fulminou
com seu olhar.
- Olhe, estou
cansada de discutir com você. Eu entendo tudo que você está passando, mas você
está exagerando já! Faça-me um favor, deixe me trabalhar em paz. – disse ela
com cara de sono.
Ela se levantou
pegou no meu braço e me levou para fora da sala, batendo a porta na minha cara.
Quis explodir, mas um suspiro de indignação saiu. Que mulher ousada. Ela me
tratava como se não fosse o chefe dela.
Voltei para o meu
escritório, encostei a porta e desabei no meu sofá. Tive a impressão de a porta
abrir e logo se fechar, mas eu estava com tanto sono que nem me importei.
A semana passou
rápida. Já era domingo, o dia do descanso. Mas era só chegar em casa que surgia
Alexandre para estragar meu dia.
Alexandre era
muito, mas muito parecido comigo, e não somos gêmeos, ele era mais velho.
“Você fica a
semana toda fora dessa casa” dizia. “Deixe ficar com a casa”... “Venda!”. Isso
estava me incomodando.
- Se você quer
morar aqui, venha, a mansão é grande o suficiente para todos nós. E pare de me
encher com essa história de assumir a empresa. Estou lidando perfeitamente com
tudo.
Naquele momento lembrei-me
de uma
grande profissional e amiga minha. Uma vez ela disse: Tudo é mágico no ramo da
publicidade, mas você vai ter que gostar muito e não desistir nas horas ruins
(levo essa lição comigo sempre).
- Não venha com essa historinha de
vamos viver todos juntos como uma grande família, isso não vai acontecer. –
disse Alexandre.
- Acalme-se Alex, não grite assim.
Vocês parecem dois primatas, e olha que nesse momento primatas discutindo
seriam em mais espertos que vocês. – disse Jully, a esposa de meu irmão. Ela
era linda. Seus olhos eram azuis e levemente puxados, às vezes lembrando uma
oriental. Seu cabelo loiro era liso e ia até a altura dos cotovelos. Ela era a
que sempre acalmava as brigas.
Um fato curioso: Conheço Jully há
anos... Para ser mais preciso, ela havia sido minha primeira namorada ainda no
colegial. Depois que terminamos pacificamente ela se apaixonou pelo meu irmão e
como éramos amigos não me importei com isso, até gostei, pois sabia que meu
irmão estaria seguro perto dela.
Dei as costas para meu irmão e
tranquei-me no meu quarto. Joguei-me na cama, fechei meus olhos e levei um
grande susto. A primeira imagem que me veio foi de Katherine Madison. Meu
cérebro de alguma forma fotografou a imagem dela na minha mente. Estava séria,
a imagem oscilava um pouco como se estivesse se apagando. Então forcei minha
memória e a imagem se estabilizou. Então de alguma forma fui entrando naquela
cena e me desliguei por completo.
Eu
cheguei perto dela, olhei nos olhos dela e ela sorriu, – como podia ter uma
imagem dela sorrindo na minha mente se a todo o momento a via de mau humor? – a
abracei e a beijei. Depois disso não me lembro de mais nada. Quando acordei já
era final de tarde. Como eu dormira tanto?
O sonho quis se dissolver, mas
tentava fixar a imagem dela sorrindo. Katherine e eu juntos? Impossível, mas
havia sido divertido sonhar isso. E quando me dei conta de que meu fim de
semana havia passado voando e que tudo iria recomeçar e que iria ficar longe do
meu irmão, eu involuntariamente disse “Uffa”.
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